terça-feira, 19 de março de 2013

O Conclave de meu coração

O homem, este solitário andante galáctico que perscruta a Deus, o qual se oculta na imensidão do Universo, jamais poderá compreender esta Sua ocultação usando apenas a razão, porém será justamente a razão que elaborará ao homem uma condição de dignidade que possa torná-lo confiante numa fé que busque Deus, o qual, absolutamente, se faz assaz presente pela própria graça de se ocultar – coisa própria de Deus e não poderia ser de outra forma: desde que é Deus, Deus, que está bem próximo ao nada, confunde a humanidade, a qual sempre se incorre na empreita de buscá-Lo apenas por uma razão inexorável à fé, isto é, uma razão que não se move à luz de uma fé.
Pela visão humana esta fé sem razão é algo que está mais próximo ao nada, contudo uma fé cooperada pela razão torna o homem próximo à visão espiritual de Deus. Desta maneira, prescindida em tal reflexão interior, as dualidades não devem ser encaradas como portadoras de contrariedades, mas sim cooperadoras para o esforço humano de encontrar Deus.
Por exemplo, se considerarmos o leigo da Igreja desempenhando uma atitude de vida baseada exclusivamente na fé, uma vez que torne a vida secular sem razão alguma para o desempenho de seus exercícios espirituais dentro da comunidade paroquiana, então poderá incorrer-se num erro sem igual, quando os mesmos católicos e também leigos num certo momento denominem, a Igreja, como uma Instituição e n’outro momento como o Corpo Místico – onde Cristo é a cabeça e o Espírito Santo é também sua alma[1].
Estaremos nós católicos preparados para enfrentar somente com a fé os desafios que uma Instituição terrena e secular merece? Por outro lado, uma fé que se empenhe em auto fermentar-se, geralmente, trará bons esclarecimentos sobre a Igreja como Corpo de Cristo? Mas, como ficam então a secularização, a Instituição e a organização pastoral, inerentemente, ligadas à Igreja? Em que se pautam? Pautam-se exclusivamente na fé? – De certo que não, pois bem sabido que deve existir uma importante dose de razão para levar a cabo os desafios cristãos.
Contudo, aquele erro – mais acima classificado – ocorre apenas quando se tenta praticar uma fé sem base argumentativa razoável [razão]. Tal erro, sem a Providência Divina, resultará ao homem numa nefasta onda de intransigência e intolerância gerando por ele uma ressignificação àquela instituição do mundo secular, logo incorrendo certa ruptura em suas próprias bases secularistas garantidas hoje muito mais por um Estado Democrático de Direito do que por uma moral cristã. Se o próprio termo Instituição é tão mais argumentado por ordenamento jurídico próprio, então tanto mais este mesmo termo precise ser purgado para o real significado ao qual Cristo quer para sua Igreja; porém não o argumentando pela fé, e sim por razões.
Assim, qualquer ressignificação razoável com a fé sempre renovará o homem em seu mundo para fortalecê-lo em sua busca a Deus através do Novo Homem, o Cristo Nosso Senhor Jesus, no entanto, se uma ressignificação razoável sem a fé torna tudo mais difícil, então de igual maneira uma fé sem uma ressignificação razoável não atenderá se quer as necessidades que os oprimidos estão configurados no mundo que vivemos atualmente.
Tanto quanto, pelo fiel leigo, que queira, apenas e tão somente pelo único e exclusivo exercício de fé, entender uma Igreja que possua como alma o Espírito Santo, concedido pelo Pai através dos méritos de Cristo, seu Filho, tão mais indispensável será a resposta que o próprio homem deve dar a si mesmo através de sua humanidade corpórea que só pode ser assentida por uma significação razoável, isto é pelo uso de sua própria razão, para estabelecer o sentido de sua busca por Deus que está oculto. Ora, nisto podemos observar como o homem depende de sua natureza humana, uma vez também caracterizada por sua razão. Igualmente, esta mesma razão que não contraditoriamente possuí sua origem na própria e inerente criação humana e que é subordinada à natureza espiritual e divina[2] – a qual por ter sua origem em Deus e por Graça do próprio Deus – concede a cada homem uma alma. Portanto, se ao leigo seja indispensável esta reflexão, quanto mais será insubstituível ao ordenamento religioso como reflexão ímpar que possibilite o acolhimento dessa Igreja que é também Mãe a aqueles seus filhos queridos que ainda careçam de um entendimento sobre a mediação que o Espírito de Deus dá entre a razão e a fé.
            O Conclave terminou. Meu conclave interior [por hora] também acabou. A Igreja e seu caminhar nos apresentam a riqueza de sua Alma, o Espírito Santo e, desta mesma Igreja, desejo cada dia mais conhecê-la, respeitá-la e, sobretudo amá-la nas ações do Santo Padre Francisco. Entretanto, ela deve estar atenta para não eximir-se de considerar de mim o meu todo, este mesmo todo que é a intensidade como o Cristo quer que ame o Pai, com toda minha inteligência, com toda minha alma, com toda minha força: razão e fé, portanto.
 
[1] Leão XIII pp; encíclica Divinum illud múnus, 1897:DS 3328; apud: L’Osservatore Romano nº 28, 11 de julho de 1998.
[2] (BOEHNER e GILSON. História da filosofia cristã, 13 ed., 2012, p. 451.) Apud S. Tomás de Aquino, Summa contra gentiles I,7